outubro 31, 2007

[Sem título]

É noite, e meu coração não me permite dormir.
A chuva mais uma vez lava a cidade e graciosamente perdoa seus pecados.
É noite e a cidade dos espelhos fenece sob o silêncio após a grande confusão:
O dia em que o sol brilhou, resplandesceu e tingiu de dourado cada centímetro de aço polido.
O dia em que o aço polido tornou-se tão musical quanto sinos de vidro - e soou no ar tépido de verão.
O dia em que a mornidão do vento trouxe consigo a languidez oriental dos gatos.
O dia em que os gatos comeram morcegos, e nada mais.
O dia em que os gatos, o dia em que as botas, o dia em que os espelhos
Retiniram todos em festa, comemorando a cidade em chamas, porque houveram chamas e houve confusão na cidade dos espelhos.
Quando chegou o final do dia, foi revelada enfim a verdade: os espelhos mentem ao contrário.
(Mas a questão, puramente estética e dialética, foi deixada de lado: a cidade é uma festa e os rojões confundem-se com o barulho dos sinos de vidro.)
O sol não se põe.

***

Alguém caminha pela cidade com a certeza de que a possui: ela, a cidade, uma babilônia apocalíptica a seduzir aqueles que em alguma ocasião puderam entrever, por momentos, um de seus pequenos pedaços brancos e pulsantes de concreto.

***

Subitamente, o sol se põe - porque precisa.

***

Então, a cidade funciona como um dia após o outro, deixando-se ocultar sob grossos cobertores de aleivosias e mediocridades para despertar em seguida, mais bela e livre do que antes, sob os eternos auspícios do astro -rei.
A lua confunde o coração dos homens e turva-lhes a visão. De novo, o silêncio de vidro pintado, a textura de porcelana a correr pelos dedos, a língua e a boca secas: ânsia e desalento.


É noite, e de novo a cidade impura.



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